8 de set. de 2008

TV na web ainda busca fórmula para o sucesso

Quando o sindicato dos roteiristas norte-americanos suspendeu a produção de televisão com uma greve, no final do ano passado e no começo deste, os produtores e roteiristas de Hollywood correram a criar novas séries roteirizadas para a web, conhecidas como webisodes por falta de termo mais preciso. A estratégia parecia simples: ganhar dinheiro veiculando programação diretamente na Internet. Meses mais tarde, eles começam a compreender que produzir conteúdo para a web pode ser fácil, mas lucrar com ele é complicado.

Embora pequeno número de roteiristas, produtores e atores estejam conseguindo ganhar a vida com os webisodes, eles continuam muito distantes de constituir uma forma estabelecida de arte, capaz de se comparar à televisão e ao cinema. O setor recém-criado não dispõe de modelos de negócios claros ou de formatos padronizados.

E também lhe faltam audiências, por enquanto. Se você perguntar a um consumidor médio de mídia a que programas de TV ele assiste na web, a reação provavelmente será um olhar de incompreensão. Caso já tenham ouvido falar de webisodes, será provavelmente no contexto de Quarterlife, uma série de Internet que fez o salto para a TV e registrou um fracasso espetacular de audiência em fevereiro, ou de Prom Queen, um drama online produzido sob os auspícios de Michael Eisner, ex-presidente-executivo do grupo Disney.

O Lost, ou quem sabe o Friends, da web ainda não nasceu. Mesmo o primeiro sucesso da nova mídia, Lonelygirl15, encontrou dificuldade para manter uma audiência. Os vídeos da menina solitária estrearam no YouTube na metade de 2006. Inicialmente, atraíam milhões de internautas, e apresentaram ao público o conceito de webisodes produzidos de maneira profissional. Mas os vídeos continuaram a surgir muito depois que o entusiasmo inicial tinha passado. Em 1° de agosto, quando a série foi concluída com uma seqüência de 12 episódios, quase ninguém estava prestando atenção.

A falta de atenção e de verbas publicitárias pode ser um sinal para as grandes empresas de mídia que desejam compensar a receita perdida na TV investindo em vídeos para a web. Mesmo assim, mais empresas vêm investindo em entretenimento digital, na esperança de que o vídeo profissional distribuído via web se destaque em meio ao mar de conteúdo produzido por usuários.

Squegees, uma série de 10 episódios da Stage 9, uma subsidiária digital da ABC, sobre um alegre grupo de especialistas em lavar janelas de edifícios altos, ilustra as dificuldades que a mídia tradicional enfrenta. O programa estreou em abril em cinco sites. No mais conhecido deles, o YouTube, o segundo episódio mostrava 312 mil visitas até domingo passado, um total ajudado por links proeminentes na home page do site em abril.

Mas no quinto episódio o total de espectadores já havia caído a três mil. Para as grandes empresas de mídia, a receita gerada por programação para a web "não é o tipo de dinheiro a que elas estão acostumadas", disse Herb Scannell, ex-presidente da Nickelodeon.

Scannell agora dirige a Next New Networks, uma coleção de séries de web dirigidas a nichos de mercado. Seu veículo mais conhecido talvez seja o canal Barely Political, estrelado pela Obama Girl, uma jovem sedutora que professa estar apaixonada pelo candidato à presidência Barack Obama. Os vídeos da Obama Girl têm atraído cerca de um milhão de visitas cada, ao menos, o que os torna atraentes como veículos de publicidade para assinantes que desejem atingir determinados nichos de mercado. Mesmo assim, "ainda não estamos vendo acordos milionários", disse Scannell. "Continua a ser um mercado emergente".

A única coisa que não falta ao setor é entusiasmo, quer vindo dos roteiristas, produtores ou atores. Os webisodes em geral têm produção barata, da ordem de apenas alguns milhares de dólares por episódio. São em geral curtos, com duração equivalente à de um segmento em uma comédia de situação na TV. E em geral são distribuídos de maneira bastante ampla, por sites de vídeo como o YouTube e sites de redes sociais como o Bebo.

O Strike.TV, um site inspirado pelas greves dos roteiristas, em breve começará a veicular programas escritos por dezenas de roteiristas de Hollywood. A atriz Rosario Dawson, um dos primeiros nomes conhecidos a migrar para a nova mídia, está estrelando uma nova série para a web bancada pela rede de TV NBC. E a Warner Brothers está lançando um site de vídeos que oferecerá meia dúzia de programas originais para a web, o TheWB.com.

Algumas empresas independentes dos grandes estúdios também estão se posicionando como estúdios digitais, com planos ambiciosos para programas dirigidos à web. O 60Frames, que financia e distribui programas na web, planeja lançar 50 séries originais no ano que vem, e formou parcerias com uma lista ilustre de nomes de Hollywood, entre os quais os cineastas Joel e Etan Cohen, o humorista David Spade e Tom Fontana, o criador da série Oz.

"Jamais houve um momento em que tenha sido mais fácil levar conteúdo a uma audiência", disse Brent Weinstein, o presidente-executivo da 60Frames. "Todo mundo está tentando descobrir como transformar essa facilidade em um negócio".

Talvez o mais conhecido dos webisodes lançados como resultado da greve seja o escrito por Joss Whedon, o produtor de TV que criou Buffy, a Caça-Vampiros. O musical de 45 minutos que Whedon criou para a Internet, Dr. Horribles Sing-Along Blog, estreou em julho e rapidamente chegou à liderança do ranking de vendas da iTunes. Whedon explicou as origens de Dr. Horrible no site da série, escrevendo que "a idéia era produzir rapidamente, produzir barato - mas fazer um bom trabalho. Produzir um espetáculo realmente emocionante, quase profissional, especificamente para a Internet. Para demonstrar o quanto se pode fazer com muito pouco. Para demonstrar ao mundo que existe outra maneira".

Essa "outra maneira" funcionou bem para Whedon, que se beneficiou do fato de já dispor de uma base sólida de fãs. Em um escritório de Los Angeles, Miles Beckett e Greg Goodfried, co-criadores de Lonelygirl15, acreditam que serão capazes de recriar seu sucesso de 2006. Com apoio de US$ 5 milhões oferecidos por empresas de capital para empreendimentos, os dois fundaram o EQAL, um dos estúdios que estão competindo pelo desenvolvimento do próximo grande sucesso da TV para a web.

"Todas as peças diferentes que precisam se encaixar a fim de permitir a produção no setor de mídia tradicional - financiamento, produção, distribuição - ainda têm situação indefinida na Internet", disse Beckett.

A maioria dos webisodes comerciais depende de publicidade em vídeo veiculada antes, durante ou depois do programa, ou de merchandising e integração de marcas durante o programa.

"Ask a Ninja", uma série de vídeos de comédia estrelados por um ninja anônimo que é atualizada em cronograma irregular, agora está atraindo US$ 100 mil ao mês em contratos de publicidade, licenciamento e merchandising. O programa é representado pela rede de publicidade Federated Media. "In the Motherhood", um programa para a web criado por uma companhia de marketing, registrou média de três milhões de visitas por episódio no segundo trimestre, superando as expectativas da Sauve e da Sprint, que patrocinaram o projeto.

Esses programas encontraram lucros ao explorar nichos de mercado. "Caso seu programa para a web tenha 35 mil espectadores mas esse público seja especialmente valioso para um determinado anunciante, é possível ganhar bom dinheiro com o programa", disse Dina Kaplan, co-fundadora do site de vídeos Blip.tv.

Para chegar ao ponto em que os espectadores escolham entre os seriados de comédia das redes de TV aberta e os do YouTube, o setor precisa de melhores modelos de distribuição, apoio e financiamento mais profissionais e um sistema independente de mensuração de tráfego.

Falta também alguma coisa como um guia de programação para a mídia de Internet - os proprietários da revista TV Guide e outros grupos editoriais estão na corrida para tomar a liderança nesse segmento. Como resultado, os anunciantes "ocasionalmente encontram dificuldades para navegar pelo mercado", disse Scannell. De maneira semelhante, o setor precisa de um fornecedor independente de serviços de análise de tráfego, mais ou menos como o serviço Nielsen de aferição da audiência televisiva. Não surpreende que tanto a Nielsen quanto diversas outras empresas estejam batalhando para ocupar essa posição, mas ainda não emergiu um padrão setorial para esse tipo de serviço.

E existe também o problema da sala de visitas.

"Seria preciso conseguir que os televisores nas salas de visitas se integrassem à web", disse Ron Richards, diretor de marketing e gestão de produtos da Revision3, que se define como "uma rede de televisão para a geração Internet".

Talvez o mais importante, dizem pessoas que trabalham no setor, é a necessidade de sério apoio promocional aos programas de TV para a web. Novos programas de televisão se beneficiam de campanhas de marketing milionárias, e os webisodes não contam com esse tipo de impulso.

Embora a idéia de que os webisodes possam se tornar mais parecidos com a televisão convencional seja tomada como anátema por muitos dos produtores que vêm se dedicando ao setor, Beckett diz que a mídia precisa de um conjunto de formatos mais estabelecido. "Na televisão, existe um punhado de formatos definidos", ele disse, mencionando comédias de situação com duração padronizada de meia hora e séries dramáticas com duração de uma hora como exemplos. "Creio que formatos padronizados ajudarão a codificar o que estamos efetivamente produzindo".

Com o tempo, os webisodes podem se desenvolver e se tornar mais parecidos com a televisão - e a TV pode se tornar mais parecida com a web, ao mesmo tempo. A rede de TV ABC está desenvolvendo In the Motherhood como série para televisão, por exemplo. E a Comedy Central está exibindo vídeos de comédia do Atom, um site adquirido pela Viacom, o grupo que controla a empresa, em 2006. Alguns executivos acreditam que os vídeos na web servirão como tubos de ensaio para projetos que poderão crescer na televisão. Já que as barreiras ao acesso à rede são tão baixas, talvez não demore muito para que um webisode se torne grande sucesso e defina a forma do gênero.

"Ter um grande sucesso que as pessoas comentem no escritório no dia seguinte em Louisville será o momento decisivo de inflexão para o setor", disse Kaplan.

Fonte: The New York Times/ Paulo Migliacci ME

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